Sétimo romance de Lionel Shriver, Precisamos Falar Sobre o Kevin, vencedor do Prêmio Orange de 2005, tornou-se um best-seller mundial que alçou a autora ao status de fenômeno literário. Aclamada por público e crítica, a história da mãe que tenta entender os motivos que levaram o filho adolescente a cometer um massacre na escola teve sua adaptação para o cinema dirigida pela premiada cineasta escocesa Lynne Ramsay. O filme, que traz no elenco Tilda Swinton, John C. Reilly e Ezra Miller, estreou na mostra competitiva de Cannes e foi eleito o melhor do Festival de Londres. Por sua interpretação da protagonista, Eva, Tilda Swinton foi indicada ao Globo de Ouro de melhor atriz.
Ao sacudir o leitor entre culpa e empatia, retribuição e perdão, Precisamos Falar Sobre o Kevin discute casamento e carreira; maternidade e família; sinceridade e alienação. Denuncia o que há de errado com culturas e sociedades contemporâneas que produzem assassinos mirins em série e pitboys. Com isso, a autora nos carrega em um thriller psicanalítico no qual não se indaga quem matou, mas o que morreu. Enquanto tenta encontrar respostas para o tradicional "onde foi que eu errei?", a narradora desnuda, assombrada, uma outra interdição atávica: é possível odiarmos nossos filhos?
Editora: Intrínseca.
Ano: 2007
O livro conta a história de Eva
Khatchadourian, uma antiga mulher de negócios, dona de uma empresa de turismo –
A Wing&A Prayer – que estava
acostumada a viajar o mundo inteiro para escrever seus guias para viajantes sem
muito dinheiro no bolso, mas que gostariam de se divertir e comer num lugar
decente. Durante a narrativa de Eva, vamos conhecendo outros dois importantes
personagens dessa história: Franklin, o americano padrão, marido de Eva, e
Kevin, o psicopata, filho do casal.
A narrativa de Eva é algo suntuosamente interessante e é
feita por meio de cartas. Sendo assim, cada capitulo seria uma carta enviada
para seu ausente marido, Franklin – na qual ela começa com o dia, mês e ano, e
um ‘querido Franklin’ em
itálico. Poético , até.
Eva é uma narradora realmente muito boa, na minha singela
opinião, pois ela descreve os personagens não somente por suas características
físicas, mas também pelo emocional e psicológico. A cada momento, ela faz uma
reflexão – bem interessante, diga-se de passagem – sobre um fato ou alguém. E
com uma bela dose de sarcasmo e ironia, é claro.
E ao longo dos capítulos, vemos o decorrer de toda uma vida
em ‘família’ – acompanhamos Eva e Franklin desde o momento em que eles discutem
sobre ter ou não um filho até a terrível tragédia que abala a vida da família
Khatchadourian: um massacre escolar, cujo culpado é... Kevin.
Eu não conseguiria escrever uma resenha sobre esse livro sem
dar uma atenção especial ao ‘personagem principal’ – de certa forma. Kevin é um
psicopata, isso fica claro desde, bem, desde seu nascimento, e o modo como Eva
o analisa é algo simplesmente aterrorizante. Cada cena, cada fato, cada
acontecimento que envolve o garoto – desde que tinha meses de vida – me deixaram
sem ar, aflita e com um tremendo ódio.
Se fosse eu, já teria me livrado daquela criança há muito,
muito tempo – ou teria dado no pé.
Acredito que o principal dilema de todo o livro não seja a
questão de “por que ele matou seus colegas de classe, a professora e um
faxineiro?” e nem “por que daquele
jeito?”, mas o grande dilema, a grande questão do livro é: “A gente pode odiar
nossos filhos?” E eu não falo ‘odiar’ naquele sentido de ‘ficarmos com raiva
por um momento, espumando pela boca’.
Eu digo ódio, raiva, desprezo.
Será que é possível uma mãe sentir esse tipo de coisa pelo seu próprio filho?
Sentir vontade de se jogar da ponte, só para não ter que olhar para a cara do
moleque, sentir vontade de matá-lo com um travesseiro, abandoná-lo num parque
escuro, arremessá-lo numa parede com força, tentar matá-lo?
Isso é possível?
Esse, sem dúvidas, foi o grande dilema que me marcou durante
a leitura. Enquanto observava Eva fazendo suas visitas semanais a Kevin na
prisão e lia sobre os acontecimentos repugnantes que rondavam o garoto, eu tive
quase certeza de que... Se fosse meu filho, eu o odiaria com todas as minhas
forças.
Eu o mataria, se tivesse chances.
Mas esse não é o único lado de Kevin. Eva também nos ensina
que psicopatas não têm um pingo de sentimentos, mas também são absurdamente
inteligentes. E eu admiro isso profundamente em Kevin. Ele era tão
inteligente, tão incrivelmente esperto que... Você chega a admirá-lo – não pelo
o que fez, é claro – de certa forma.
Não pretendo dar nenhum spoiler, é claro, e somente digo uma
coisa: Leiam esse livro. Por favor. Ele precisa ser lido, entendido, admirado,
odiado. Foi o único livro, o único,
que me fez sentir ódio, um tremendo ódio, de um personagem.
Pior. Foi o único livro que me deixou com medo. Medo mesmo.
Medo de verdade.
Medo do Kevin.
É um livro altamente incrível que – preciso falar sobre isso
– me deixou sem sono e um pouco modificada por dentro. Esse é um daqueles livros que mexem com seu interior, modifica de
uma forma, que é impossível retornar ao que era antes.
Você sempre vai pensar “Kevin falaria isso” ou então “Kevin
fez isso assim”. E sempre que vir um mapa vai pensar em Eva, em como ela amava
viajar pelo mundo – aliás, esse livro me abriu o apetite para viajar para
lugares exóticos! – e explorar cantos que ninguém nunca foi. Vai lembrar
Franklin com seu rosto bronzeado e seu jeito divertido de americano padrão.
E, se você deseja ter filhos, bem, pense um pouco antes de
tomar a decisão, ok?
Lembre-se de Kevin.
Você seria capaz de lidar com um filho como ele?
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